quinta-feira, 12 de março de 2009

Fundamentos para uma teoria sociológica dos jogos


As tentativas de criar/elaborar uma teoria dos jogos não são actuais. Diversos e eminentes autores têm procurado estabelecer uma via que possibilite abarcar todos os jogos em categorias que estabeleçam uma organização nos vários aspectos que o jogo apresenta. Assim, autores clássicos com enfoques diferentes, como Piaget (1975), Huizinga (1938), Giradoux (1946), entre outros, procuraram estabelecer classificações e categorias mas, no entanto, ficaram devendo quanto a abrangência de um sentido lato, universal do jogo. Não podemos deixar de citar a nobreza de Schiller (1990) que, na observação dos jogos das nações centro-europeias, verificou que o povo, ao propor seus jogos, possibilita reconhecer seus gostos e relativamente caracterizar sua cultura. Schiller procura nos jogos a essência da arte, tese esta que marcou em sua literatura quando o homem - na busca o ideal de beleza - encontra no impulso lúdico o pleno sentido de jogar. Schiller convertido a leitura e ideias de Kant, retira o jogo da discussão matemática e moral para destinar o papel das preocupações estéticas.


Sobre as bibliografias dos jogos, veremos que a maioria dos autores só se preocupou com certos tipos de jogos e sua classificação em particular, aqueles que correspondiam às suas teorias explicativas, e menosprezou ou suprimiu sinteticamente a imensa maioria de jogos paralelos e intermediários, em outros casos, sequer abordaram o universo do jogo.

Piaget resumiu o seu trabalho nos aspectos pedagógicos do jogo. Estacionou suas teorizações no jogo escolar e no brinquedo. Deteve-se nos jogos infantis, atribuindo-lhes classificações no terreno da possibilidade da aprendizagem.

É com W. Benjamin (1984) que podemos entender a relação do jogo nos brinquedos. Os autores que teorizaram os jogos não discutiram a propriedade da dimensão imaginativa nos brinquedos já dados e construídos pela cultura. Benjamin busca exemplos na fabricação do brinquedo primitivo nas cidades alemãs do século XIX que, mais tarde, foram substituídas pelas oficinas industrializadas.

J. Chäteau (1987), atribui ao jogo função utilitária, entendendo a infância como espaço de treino para a vida adulta, passando pelo jogo. Château apresenta elementos encontrados em diversas classificações dos jogos: o jogo é sério, possuindo regras rígidas e convencionais. Em sua execução, chega-se á fadiga e às vezes ao esgotamento físico. No entanto, não revelou uma teorização mais aprofundada desses elementos. Para o autor, o jogo é tido como fuga do quotidiano causado pelo tédio do trabalho. Se assim admitirmos, o jogo leva a uma obsessão que compromete a posição gratuita e desinteressada de quem joga, dimensão essa tão latente na maioria das definições de outros autores.. Mas, esse autor vem revelar uma posição que diverge de outra teorias, pois entende que o jogo não é uma cultura residual que foi absorvida pelo mundo do jogo.

Em Huizinga, a teoria dos jogos é constituída com mais profundidade e, por sua vez, tendo mais inflexões na literatura em diversos cantos do mundo académico ocidental. A teoria de Johan Huizinga, em sua obra de 1938, Homo Ludens, defende a tese de que a cultura provém do jogo. Essa tese se arraigou em diversos campos de actuação de sociólogos, psicólogos e pedagogos, onde jogo é simultaneamente liberdade e invenção, fantasia e disciplina e todas as manifestações culturais são deles originadas. Esse autor entende o jogo como uma instituição autónoma. No entanto não mostra onde reside o processo acumulativo do jogo para que ele possa se constituir autonomamente.

Huizinga fundamenta a teoria de que o jogo é de fato mais antigo que a cultura, pois este mesmo em suas definições menos rigorosas pressupõe sempre a sociedade humana. Guttmann (1979), ao comentar o trabalho de Huizinga, argumenta que ele, ao fazer a distinção entre competições que são e que não são jogos, estabeleceu uma confusão que diminui consideravelmente o valor do seu trabalho. É o próprio Guttmann quem se vale das críticas de Caillois quando aponta que o trabalho de Huizinga "[...] não é um estudo dos jogos mas uma pesquisa com bastante fecundidade do jogo-espírito no domínio da cultura [...]", pois, ignorando a distinção entre jogos e os que não são jogos competitivos, "Huizinga administra e escreve um fascinante livro, mas fundamentalmente ofusca-o com poesia, religião, jogo, guerra, arte, música e política"(p. 71). Numa análise sem desprendimento de situar o jogo e a cultura, e sem querer finalizar a questão, temos que admitir que o gosto pela competição, a busca da sorte, o prazer pela simulação e a atracção pelo vertiginoso surgem, indiscutivelmente, como factores preponderantes do jogo, mas a sua acção se envolve na vida das sociedades e, e outra forma, a vida da sociedade se engendra nos jogos, embora de modo e intensidade diferentes.


ANJOS ,Luiz dos. O jogo e a dimensão humana: uma possível classificação antropológica
Luiz dos AnjosDoutor em Ciências Sociais pelo Depto de Antropologia daPontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC/SPUniversidade Federal do Espírito Santo Vitória, ES

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